Antonio Nahud JúniorNão tinha fé em Deus, mas certamente Deus teve fé nele. Saramago sonhou com uma terra livre da opressão, da miséria e da perseguição política. Sonhou com um mundo em que os fortes eram mais justos e os justos eram mais fortes. Era um grande escritor, um dos maiores da língua portuguesa. Era um homem que acreditava nos homens, mesmo quando os questionava. Eu tive o privilégio de conhecê-lo. Entrevistei-o algumas vezes - uma dessas entrevistas pode ser lida no livro “ArtePalavra – Conversas no Velho Mundo”. Voltei a encontrá-lo na Bienal do Livro de Paris e em eventos literários em Portugal e Espanha.
Acredito que a perda de um escritor pensador não é uma perda comum. É irreparável, ainda que outros escritores pensadores surjam, e eles surgem sempre, com toda a força, contra a maré da idiotia que permeia os tempos de hoje. A perda de um escritor pensador é como um sulco na terra, nunca para sepultar seu corpo, mas como um baixo relevo que sua alma crava quando dá o salto para o exato desconhecido que a razão tanto negou.
Neste momento olho antigas fotos minhas com Saramago. Lembro das nossas longas conversas num tradicional hotel em Lisboa e na sua biblioteca em Lanzarote - nas Ilhas Canárias -, sempre na presença de sua simpática esposa Pilar. Era um homem bom e sincero. Sinto-me órfão da sua figura de Dom Quixote e das suas palavras confortantes. Ele, Saramago, partiu para o outro lado da lua. Ele que um dia disse: “A arte é tudo, todo o resto é nada. Só um livro é capaz de fazer a eternidade do mundo".
O autor é escritor e jornalista e tem o ótimo blog www.cinzasdiamantes.blogspot.com
Foto: Arquivo pessoal do autor (nma foto com mestre Saramago)
Obrigado pela publicação, Cefas!
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