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Rossana Pinheiro: "Para as minorias, o direito mais fundamental, que é o de ir, vir e permanecer nos espaços ainda é desrespeitado no RN"


Advogada por formação acadêmica, Rosana Pinheiro é responsável, desde o ano de 2004, pela Coordenadoria de Defesa das Mulheres e Minorias no Rio Grande do Norte. Antes de assumir o cargo, Rosana ficou à frente da Delegacia da Mulher em Natal por seis anos. Semana passada, comemorou alguns avanços na luta em defesa das minorias. Confira abaixo a entrevista concedida aos jornalistas Cefas Carvalho e Roberto Lucena. As fotos são de Jefferson Lira

Cefas Carvalho: Como a senhora analisa a posição das minorias em 2010 no RN? Ao longo dos anos, houve progressos significativos?
Sem dúvidas, melhorou. Embora ainda não tenhamos as estruturas necessárias para um bom atendimento e dar os encaminhamentos que os chamados grupos minoritários necessitam. Há dez anos, não existia nenhuma estrutura específica para atender as chamadas minorias. São minorias, pois não conseguem ter os espaços de cidadania. Têm dificuldade de exercer a cidadania plena. Mas as coisas melhoraram. Como os homossexuais, por exemplo. Hoje, temos algo inusitado no Rio Grande do Norte, que é o Disque Defesa ao Homossexual (0800-281-1314), e alcança o estado inteiro. É um canal de diálogo com os homossexuais - leia-se gays, lésbicas, transexuais, as travestis. As estruturas criadas servem também para abrir espaço de discussão com a sociedade.
Roberto Lucena: Estamos vivendo um momento propício ao debate para melhoria da qualidade de atendimento ao cidadão, as eleições. Algum pré-candidato mostrou-se disposto a lutar pelas minorias? Alguma proposta de governo nesse sentido?
Não temos conhecimento de nenhuma proposta de nenhum dos candidatos. Nenhum deles. No tocante às estruturas para atender as minorias. Para que a gente possa provocar esses candidatos, é necessário que eles dialoguem com os movimentos organizados. Os movimentos sabem muito bem o que querem. Algumas pessoas sem consultar os movimentos falaram, no passado, de criar uma delegacia especializada em defesa do homossexual. Os movimentos homossexuais não querem isso. Eles não querem porque acreditam que esses espaços vão ser guetos, menos privilegiados que outros. Não estabelecemos uma discussão ainda. Falo do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) porque esse é o grupo menos favorecido com as mudanças ocorridas, embora tenhamos o Centro de Referência de Combate a Homofobia, que desenvolve um bom trabalho. Mas precisamos de outras estruturas. Não só de segurança, mas em outras áreas, como a saúde, judiciário.
CC: Essas mudanças devem passar também por uma conscientização da sociedade?
É necessária uma conscientização geral. Acho que a palavra certa é reeducação. Educação é a palavra-chave. As pessoas não estão preparadas devido a toda uma cultura que invisibilizou esses grupos. As minorias não estão sendo vistas e contempladas. É como eles não existissem. Eles recebem o tratamento sem contemplar aquela especificidade única daquela pessoa em virtude da peculiaridade de sua condição, seja a orientação sexual, cor ou condição física. Vejo, por exemplo, as pessoas com doença mental. São extremamente discriminadas dentro dos espaços públicos. Pelo fato de ter uma doença mental, a pessoa não tem credibilidade. Muitas vezes sofre violência, inclusive nos hospitais, e ao relatar o problema, não é investigado. É preciso lançar um novo olhar para respeitar cada pessoa na sua condição peculiar.
RL: Qual tipo de direito, garantido pela Constituição, é mais negado às minorias?
O direito mais fundamental, que é o de ir, vir e permanecer nos espaços. Existe o caso emblemático das travestis. Elas estão muito mais nos espaços noturnos porque no dia-a-dia há uma rejeição à essas pessoas. Existe um projeto do Governo Federal que fala justamente da inclusão dessas pessoas nas escolas. A travesti não consegue freqüentar a sala de aula, pois não existe uma educação dos alunos, nem dos professores, para incluir aquela pessoa na sala de aula. Falo das travestis, mas também há as pessoas com deficiência física e mental que têm dificuldades das mais diversas naturezas, desde a acessibilidade quanto à inclusão e elaboração de atividades que elas possam participar.
CC: As minorias, de uma forma geral, têm consciência de que existe órgãos que estão dispostos a ajudá-las?
Infelizmente ainda há muitos grupos, especialmente no interior do estado, que desconhecem as estruturas criadas. É um desafio para a gente. Precisamos divulgar na mídia. Estamos lutando pelos espaços, mas ainda é pouco. As denúncias contra abusos contra o homossexual, por exemplo, são maiores nas cidades onde há grupos organizados.
RL: E como está o trabalho nas delegacias em defesa das mulheres?
Temos cinco delegacias no estado: duas em Natal, Caicó, Parnamirim e Mossoró. Temos a necessidade de ampliar o número de unidades, mas não temos recursos humanos para tanto. Resolvemos criar um projeto denominado “Porta da Cidadania”. Semana passada já recebemos os recursos, do Governo Federal, para instalar o projeto. Não vamos criar outras delegacias. A alternativa é esse projeto que será desenvolvido dentro das delegacias comuns no interior. Serão salas onde a prefeitura irá disponibilizar assistentes sociais para acolher a mulher e o idoso nessas delegacias. A proposta é usar o espaço da delegacia e os assistentes irão acompanhar o atendimento. Isso irá inibir ações não humanas. Vamos começar o projeto ainda em julho.
CC: E com a estrutura existente, as delegacias estão desenvolvendo o trabalho esperado?
Dentro da estrutura que existe, as delegacias estão fazendo o melhor possível. A estrutura física não é das piores. O problema são os recursos humanos. Há uma demanda muito grande. E precisa de material e equipamento também. Em relação a isso, a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres conseguiu projeto para que nós equipássemos duas delegacias no RN. Fizemos um estudo e decidimos contemplar as delegacias de Parnamirim e da Ribeira. Virão aparelhos de fax, computadores, viatura. Acho que isso já é um avanço. Estamos trabalhando dentro dos limites da nossa capacidade.

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